quinta-feira, 27 de março de 2008

Enamora-te

Lembrei-me agora de como é bom estar apaixonado. É claro que é lixado se não somos correspondidos, mas isso são outros tostões. Quero vós falar da energia que empenhamos e transmitimos quando estamos apaixonados. É fantástica, desde da hora que nos levantarmos até ao deitar.
Se for preciso andamos o ano todo molengões, frustrados a nos queixarmos da vida, mas se estamos apaixonados, temos pica para tudo, ui e ninguém nos pára.
Olhamos pela janela para os ver chegar, pulamos de alegria, ajeitamos a casa, o cabelo, a roupa. Aquele frio na barriga antes dele ou dela chegar, toca a campainha e tentamos ter o melhor ar possível.
Um toque, um beijo, uma palavra tomam proporções gigantescas. Revivemos durante horas ou dias e em alguns casos anos, aquele toque, aquele beijo, aquela palavra, como se fosse o bem mais precioso e nessas alturas é mesmo.
Quando estamos apaixonados, nem nos apercebemos o quanto chatos somos, há os extrovertidos que bombardeiam os amigos com todas as informações, “ ele faz assim, ela é assado…” enfim temos que ouvir e calar. Depois há os introvertidos, aqueles que andam com um sorriso muito parvo e que quanto mais perguntamos, menos nos dizem. E aliás torna-se verdadeiros “acrobatas” Experimentem ”E então ela é fixe?” a resposta é um sorriso ainda mais parvo, um deslizar de perna descrevendo um meio circulo no chão, mordiscam o lábio, não esquecendo o baixar da cabeça como se estivessem envergonhados e quando damos por eles, já nós desapareceram da vista e quanto a ela ou ele nada.
Estar apaixonados torna-nos mais bonitos, mais alegres, mais fáceis de lidar.
Eu decidi que está é a melhor forma de estar na vida. Apaixono-me por tudo o que gosto, e vivo esse amor até achar outro. Pois está claro, que estes amores não são eternos, mas nada o é na vida, portanto dure o que durar o importante é sentir a energia de estar apaixonado e aproveitar o momento. Costumam dizer “nada como um amor para curar o desgosto de outro” e é bem verdade. Tudo bem, sofrer de amor é lixado, mas passado o período de dor, não percamos tempo, a vida é demasiado curta para a passarmos a choramingar pelos cantos. Com o início da primavera, a natureza começa a namorar, e nós? Porque não nos enamoramos também.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Essas vidas

Quando conheço alguém dou-me ao trabalho de lhe dedicar tempo, não é tempo real, porque são só os meus sentidos que estão em alerta para absorver, os primeiros gestos, o aroma, o espaço, o som desta nova pessoa que se cruza no meu caminho. Tento obviamente fazer isso discretamente, as vezes percebo que do outro lado estão a fazer o mesmo. Há quem faça disto uma arte, há quem avance as perguntas essenciais e desarmantes logo nos primeiros momentos. Há também quem não pergunte nada de importante ou ao menos à partida assim parece, que não é nada de importante.
Naqueles breves momentos de avaliação, percebemos a dimensão do outro, percebemos quem vai conduzir a conversa, quem vai dominar. E digo não estou a falar de homens, estou a falar dos dois géneros.
Existem pessoas que vivem vidas tão distintas das nossas, lembro-me do dia que conheci um “puto” com 20 anos que já conduzia um Porsche Cayenne e não foi o papá que lhe deu, nem andou em negociações ilícitas. Trabalhou, é verdade trabalhou mesmo. Tem uma maneira de estar, de falar, que parece conter o mundo inteiro naquela cabeça. Um génio? Tenho as minhas dúvidas, não sei, para mim continua a ser um “puto”, especial é certo.
O Sr. Manuel é outra das pessoas que fazem parte da minha colecção especial “ A vida mirabolante dos outros”. O Sr. Manuel é o mecânico do meu carro, tem o ar exactamente de mecânico, mas daqueles à moda antiga de macacão azul anil, todo machado de óleo e derivantes. Num dia em que a minha paciência para os assuntos mecânicos já se esgotara, o Sr. Manuel volta-se para mim e diz-me “ A menina tem de ter mais calma, anda sempre stressada, ande-la comigo que vou-lhe mostrar uma coisa” E lá fui atrás do Sr. Manuel, lá para o fundo do quintal. Subimos uma escada entramos numa pequena sala, fiquei estupefacta a olhar para a sala, parecia que tinha entrado numa outra época, os anos sessenta ou seria setenta, as paredes bem decoradas com pin ups, discos de vinil muito bem arrumados, vários cristais, troféus, tudo muito antigo, mas muito cuidado estilo museu. E lá foi o homem pôr música. E eu a olhar para ele de braços cruzados, a pensar mas que cena, com o meu carro por arranjar e ando nisto. Ele agia quase como se eu nem estivesse ali, preparou as cadeiras na varanda, abriu o armário e tirou uma caixa de madeira. Disse para me sentar na varanda, levou a caixa para a mesa e abriu, estava cheia folhas de tabaco, vários cachimbos, cigarrilhas, charutos. E diz ele “escolha o que quiser, mas seja ambiciosa”. Ai a minha vida, escolha o que quiser, mas eu nem fumo. Lá fiz a vontade ao homem, disse que queria um charuto e ele sorriu, disse “ boa escolha, vou te acompanhar e fumar também um, agora faz o que eu fizer”. Lá fez ele um ritual de preparação ao qual eu segui. Acabei por me acalmar e esquecer das horas, do carro, que se lixe pensei eu, mas meia hora menos meia hora. Comecei a fumar e começa ele “ Reparou nas coisas que tenho na sala, imagino que nem saiba de onde elas vêm, pois minha menina tal como o charuto que está a fumar elas vêm de Cuba e tal como eu e eu nem me chamo Manuel…” e por ali continuou a contar a sua historia incrível e eu a fumar charuto.

Lembro-me de quando conheci a Teresa, via-a quase todos os dias, trabalhávamos no mesmo prédio, bonita, sempre com um ar impecável, capaz de fazer revirar os olhos de qualquer homem. Ficamos presas um dia no elevador as duas sozinhas. O arranjo ia levar no mínimo uma hora, as únicas palavras que já tínhamos trocado eram os cumprimentos habituais. E ali estávamos as duas. Conversa puxa conversa, lá fomos fazendo um historial das nossas vidas, até que eu em tom de ironia, digo “ Qualquer homem neste prédio, quereria trocar de lugar comigo, só para estar aqui contigo, com a boazona escritório ” ao que ela responde “e eu não quero nenhum, a minha fantasia é estar presa num elevador exactamente com uma mulher”. Primeiro rimos mas depois comecei a ficar um pouco incomodada. Que queria ela dizer ao certo com aquilo ainda nem tinha acabado de raciocinar e já ela dizia “ sou lésbica”. Não consegui suster as gargalhadas, ri-me tanto que já estava a chorar. Ela ria-se e dizia “ eu sei é irónico”.

Há pessoas muito interessantes, que mostram logo como são, há outras intrigantes, pura novidade a cada palavra a cada gesto.